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Carros elétricos poluem mais? Estudo esclarece

Afirmação de que os carros elétricos geram mais poluentes desde a produção e pelo desgaste exagerado dos pneus é erro de interpretação de estudo

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Os carros elétricos ainda são vistos como uma das melhores alternativas para reduzir as emissões de poluentes
Os carros elétricos ainda são vistos como uma das melhores alternativas para reduzir as emissões de poluentes Foto: Audi/Divulgação

Na medida em que vários países como Estados Unidos e Alemanha continuam a fazer a transição para o uso de veículos elétricos, publicações visualizadas milhares de vezes nas redes sociais desde 6 de março de 2024 afirmam que um estudo demonstrou que esses tipos de automóveis poluem 1.850 vezes mais do que os carros movidos a combustível. Mas essa é uma interpretação equivocada do estudo, cuja conclusão indicou que os desgastes dos pneus emitem 1.850 vezes mais partículas finas do que os escapamentos, sem distinguir os tipos de automóveis.

“Carros elétricos poluem 1.850 vezes mais que carro a combustão”, diz uma das publicações que circulam no X (ex-Twitter), no Facebook e no Telegram.

As publicações citam um estudo feito por uma empresa do Reino Unido, chamada Emissions Analytics. Postagens semelhantes circulam em inglês, francês, tcheco, espanhol e romeno.

Carros ônibus e caminhões em engarrafamento em avenida de Belo Horizonte
Transporte feito com veículos pesados a combustão contribui para aumentar os índices de poluição Foto: Beto Novaes/E.M/D.A PRESS

Algumas postagens incluem a imagem de um artigo publicado em inglês pelo portal “LifeSite News”. O artigo, com data de publicação de 8 de março de 2024, porém, não está mais disponível no site.

Por meio de uma consulta usando a ferramenta Wayback Machine, a AFP encontrou uma versão do texto arquivada, cuja introdução diz: “O estudo de 2022 da Emissions Analytics, com sede no Reino Unido, revelou que após percorrer 1.000 milhas com um carro elétrico e um a gasolina, o número de partículas emitidas pelo veículo elétrico era muito superior ao do carro com gasolina”.

“Embora muitos pensem nas emissões do escapamento, o desgaste dos pneus também exerce um papel importante na emissão de poluentes. A borracha sintética usada na fabricação dos pneus contém determinados produtos químicos que são liberados no ar”, continua o texto.

Estudo distorcido

A AFP procurou o estudo publicado pela Emissions Analytics, um grupo de pesquisadores britânicos especializados na “elucidação científica das emissões reais” produzidas por diferentes tipos de veículos.

A análise compara as emissões de partículas finas provenientes dos escapamentos com as do desgaste dos pneus de diferentes tipos de automóveis em condições “normais” de direção. A conclusão é que as emissões associadas ao desgaste dos pneus “são quase 1.850 vezes maiores do que as primeiras”.

De acordo com o estudo, as emissões do escapamento tendem a diminuir devido ao uso de filtros mais eficientes. No entanto, “as emissões referentes ao desgaste dos pneus aumentam à medida que os veículos ganham mais peso e potência”.

A AFP contatou Nick Molden, fundador e diretor-geral da Emissions Analytics, em 21 de março de 2024, que declarou que “é completamente falso supor isso [que o estudo mostra maior poluição dos carros elétricos]” e ratificou que não concluíram que os veículos elétricos poluem mais do que os a gasolina.

“Nosso estudo compara a massa de partículas finas produzidas pelos pneus à medida que se desgastam com a emitida pelos escapamentos, o que dá esta ordem de grandeza de 1.850, que é exata e mantemos”, explicou.

Emissões dos carros movidos a combustível

Molden lamentou que as publicações compartilhadas nas redes sociais deturpem a análise ao comparar os carros elétricos com os movidos a combustível, quando “o principal contraste [observado] é entre as emissões relacionadas aos escapamentos e as causadas pelo desgaste dos pneus, independentemente do tipo de veículo em questão”.

Ele também destacou as consideráveis emissões de CO² provocadas pelos escapamentos e mencionou que as partículas finas relacionadas com os pneus são “um problema que pode ser mitigado, mas de nenhuma maneira uma razão para não tornar elétricos” os automóveis.

Simona Onori, professora especializada em engenharia energética da Universidade de Stanford, explicou à AFP que “a poluição causada pelo desgaste dos pneus é um motivo de preocupação que afeta todos os veículos, sejam elétricos ou à gasolina”.

Diversos especialistas também já explicaram à AFP que os carros elétricos têm um impacto ambiental menor do que os movidos à gasolina.

Um relatório de 2022 do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) detalha que quando os carros funcionam com eletricidade diminuem o uso de carbono e isso“ se constitui em uma alavanca para reduzir consideravelmente as emissões de gases de efeito estufa provenientes das fontes mais importantes do setor dos transportes”, incluindo os automóveis.

Onori explicou que embora os veículos elétricos tendam a ser mais pesados devido às suas baterias, o que aumenta o desgaste dos pneus e geraria mais emissões, a diferença é relativamente pequena em comparação com as emissões dos escapamentos no setor dos transportes.

“Quando se trata de mudanças climáticas, as emissões [relacionadas ao desgaste dos pneus] são irrelevantes”, disse à AFP em 25 de março Dennis Wamsted, analista energético do Instituto de Economia e Análise Financeira de Energia (IEEFA, pela sigla em inglês).

“Os carros elétricos são muito menos poluentes que os a gasolina ou a diesel no que diz respeito às emissões de gases do efeito estufa”, acrescentou Wamsted.

Uma análise publicada em julho de 2021 pelo Conselho Internacional de Transporte Limpo, uma ONG norte-americana especializada em transportes e ecomobilidade, destacou que os veículos elétricos produzem até 68% menos emissões de gases do efeito estufa durante seu ciclo de vida – desde a produção até o seu desaparecimento –, em comparação com os carros à gasolina, apesar de a rede elétrica seguir dependendo dos combustíveis fósseis. (Manon Jacob/AFP)

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