Em setembro do ano passado, o gerente de estacionamento Rogério Júnio Alves Plautino pediu emprestado o carro de um amigo, que mora em Belo Horizonte, para ir até sua casa, em Santa Luzia, na região metropolitana. Já dentro do município vizinho à capital, descuidou-se e acabou falando ao celular, enquanto dirigia. Há poucos dias, três meses depois, foi procurado pelo amigo, surpreendido por ver, na internet, que o veículo tinha uma multa originada pela infração de falar ao celular. Rogério prontamente assumiu a responsabilidade, mas já era tarde. Como o amigo não recebeu a notificação da autuação em sua casa, não havia mais como transferir a pontuação.
A intenção de Rogério foi boa, mas, mesmo pagando a multa, dificilmente conseguirá livrar o amigo dos pontos com os quais o "presenteou". O problema, que é bastante comum, é que a única maneira de o proprietário do veículo transferir a pontuação para quem de fato a cometeu (quando é o caso) é preenchendo um canhoto que vem junto à notificação da autuação, enviada à residência do dono do carro e, normalmente, com prazo de 15 dias para sua apresentação ao órgão de trânsito autuador (prazo contado da data calculada para o recebimento da notificação em casa e que vem expresso no próprio documento).
Sem saída
"A notificação da autuação (primeira notificação que o motorista recebe em casa) vem com o formulário para indicação do condutor infrator e é o único momento para isso. Quando já sabe que houve a infração, mesmo não tendo recebido a notificação, o motorista também pode ir ao Detran e pegar o formulário, mas tem que coincidir de ser ainda dentro do prazo. Entretanto, se não recebe a notificação e não sabe da multa, infelizmente não tem jeito", lamenta a advogada Luciana Mascarenhas, especialista em trânsito.
Luciana lembra que, antigamente, o Detran-MG aceitava analisar o pedido de transferência dos pontos, mesmo depois do prazo, por meio de abertura de processo administrativo. "O real infrator fazia uma declaração assumindo a responsabilidade, com firma reconhecida em cartório, e em 90% dos casos o Detran aceitava. Mas agora não aceita mais. O pensamento é o de que a pessoa sabia da infração e deveria ter ficado atenta ao prazo. Só que, muitas vezes, ela não sabia", diz. "O pior é quando o dono do carro é ainda permissionário e acaba perdendo a carteira por causa desses pontos. Ou na situação em que, devido a essa infração que não cometeu, acaba atingindo os 20 pontos", acrescenta a advogada. A implicação também é maior quando o proprietário do veículo é pessoa jurídica que, por não ter feito a indicação do condutor, terá a multa cobrada em dobro (ou multiplicada mais vezes) ao ser autuado novamente dentro do período de um ano.
A dica da advogada, para evitar surpresas desagradáveis, é sempre consultar o site do Detran (www.detrannet.mg.gov.br) para averiguar se há multa. Se descoberta ainda na fase de defesa da autuação e com poucos dias da data do cometimento da infração, ainda há tempo de ir ao Detran (unidade da Rua da Bahia, 1.635) e pegar um formulário para fazer a transferência, documento que também pode ser retirado no próprio site (clicando-se em habilitação, solicitação de serviços e identificação do condutor infrator). A transferência de pontuação não impede que se entre com recurso contra a multa.
Só justiça
A coordenadora de infrações e controle do condutor do Detran-MG, Cristiane Lima, confirma que, nesses casos em que, por algum motivo, o dono do carro não recebe a notificação da autuação em casa, pelo menos por enquanto a única maneira é tentar tomar ciência da multa na internet e buscar o formulário para fazer a transferência, dentro do prazo legal de indicação do condutor infrator (que pode ser calculado em torno de 45 dias depois da data de cometimento da infração: 30 dias de prazo para expedição da notificação pelo órgão de trânsito, mais 15 dias para o proprietário informar o condutor, contados mais ou menos da data em que se recebe a notificação em casa). Caso contrário, a única saída é procurar a Justiça.
Comprovação de notificação
Especificamente nos casos em que a notificação não chegou à casa do proprietário do veículo (desde que não tenha mudado de endereço), existe ainda a possibilidade de pedir o cancelamento da infração, por meio de recurso na fase de defesa da autuação ou Junta Administrativa de Recursos de Infrações (Jari), com possibilidade de tentativa em segunda instância junto ao Conselho Estadual de Trânsito (Cetran).
Isso será possível nas situações em que o órgão de trânsito que multou não conseguir comprovar que houve a notificação (três tentativas do correio/verificação do AR e posterior publicação em diário oficial). Para obter a informação, o proprietário do veículo pode pedir a comprovação indo pessoalmente ao próprio órgão de trânsito (órgão que multou) e depois entrando com o recurso, ou diretamente no recurso.