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Rodas e pneus - A história dá voltas

Conjuntos de rodagem estão ganhando aros cada vez maiores em carros de série, como nos modelos de antigamente, enquanto o perfil do pneus diminui na mesma proporção

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Além da estética pouco inspirada, os primeiros carros mantiveram o parentesco com as carruagens em relação às rodas grandes e raiadas – a maioria de madeira – e aos pneus sólidos. Como todo o resto, não tardou muito para o conjunto de rodagem evoluir. A adoção de câmaras de ar permitiu a criação de pneumáticos mais altos e flexíveis, aliados a rodas menores, deixando para trás nos anos 1930 a época dos Ford T e seu conjunto aro 21. Tudo em nome do conforto de rodagem, que passou em pouco tempo a fazer companhia a outra exigência: o desempenho dinâmico. O encolhimento das rodas coincidiu, não por acaso, com a ampliação das vias pavimentadas. Modelos como o Ford Thunderbird, lançado em 1955, trocaram as rodas 15 polegadas por outras menores, aro 14, mesmo sem variar o diâmetro.

A opção por maior performance ganhou força mesmo após a escalada de desempenho dos anos 1960 e também por conta dos pneus radiais, mais resistentes que os diagonais, formados por mantas sobrepostas. Esse tipo de pneumático, além de não ter câmaras, tem estrutura reforçada por cordões de borracha ou de aço estendidos no sentido transversal. Esportivos dos anos 1960, como o Mercedes-Benz SL 280, conhecido como Pagoda, ainda usavam rodas aro 14 polegadas, com pneus de seção larga, 195, porém de altura elevada: perfil 70. Em poucos anos, as rodas começaram a ganhar diâmetro e na década de 1990, a opção de conjuntos 17 polegadas e pneus com largura superior a 200 mm já era comuns lá fora.

GIRANDO Se os grandes aros voltaram a deixar suas marcas, os pneus não prometem retornar à magreza. Vendo que o consumidor pede esse tipo de roda no mercado paralelo, montadoras nacionais já trazem jogos maiores como opção de fábrica. Atualmente, o Fiat Bravo T-Jet conta com opção de rodas medida 18 calçadas com pneus 225/40.

O apelo estético funciona como chamariz. “Se um jogo de rodas será fator de atração em uma mudança de ano/modelo, pode acontecer o trade-off, quando é barateada ou excluída outra parte que não tem tanta importância para o cliente, mais ligado a aparência, itens e acabamento”, revela José Penteado, engenheiro da Sociedade de Engenheiros da Mobilidade, SAE Brasil. “A compra da roda é algo emocional, vai muito em relação ao desenho e apelo esportivo que empresta ao carro”, explica Paola Grilli, diretora da Scorro.

VANTAGENS Somado a estética, há outras vantagens. “Ganha-se em dirigibilidade, performance e segurança. O perfil baixo e a largura fornida fazem com que o pneu não dobre tanto em curvas, enquanto a maior área de tração dá aderência em arrancadas e frenagens”, enumera Marcelo Rodrigues, coordenador de marketing de produtos da Goodyear. O uso de pneus mais largos não aumenta o risco de aquaplanagem, já que as bandas de rodagem escoam um volume maior de água.

Para os fabricantes, o crescimento é exigência de ordem prática. Não apenas para garantir o equilíbrio de automóveis apimentados, como também para abrigar discos de freio igualmente maiores. Para se ter uma ideia, um esportivo como o Audi S3 tem rodas 18 polegadas – em pneus 225/40 – e discos ventilados de 17 polegadas. Não raro, modelos topo de linha estão vindo com jogos de 20 polegadas, que até parecem pequenos diante do mundo dos equipamentos. O chamado estilo Dub de rodas personalizadas sempre superiores ao aro 20 (dub é uma gíria que faz referência ao número) envolve até aros 30, enfeitados – e pesados.

Exatamente na contramão da leveza, valorizada pelos fabricantes, já que permite que o conjunto copie melhor o piso e ganhe corpo sem pesar na balança. Principalmente nas rodas forjadas, formadas por um único bloco de metal forjado sob pressão – até 30% mais leves e mais resistentes a impactos. Em razão do alto custo, a maioria das rodas são do tipo fundidas, feitas pela fundição de um bloco de metal derramado em um molde, relegando as forjadas aos bólidos e comerciais. “Em um carro normal, a redução de peso tem um impacto pouco perceptível para o motorista comum”, garante José Penteado da SAE Brasil.

CARRO DE BOY Mesmo que sejam comuns como opção de fábrica, os jogos mais esportivos são um fenômeno do pós-venda. Só que as vantagens perdem força diante das desvantagens das adaptações. Na hora do upgrade, o conjunto não pode ultrapassar o diâmetro original em mais de 3%, tanto para mais quanto para menos – a largura não pode ultrapassar os para-lamas, por lei. “Se aumentar demais o diâmetro, a relação será alongada, prejudicando as arrancadas. A roda também tem que caber na caixa de rodas e jamais raspar, mesmo com carga total”, alerta Carlos Henrique Ferreira, da Renault. Afora isso, velocímetro e odômetro vão apresentar discrepâncias. Sem falar nos sistemas eletrônicos, como controle de tração, que precisam ser recalibrados. Outro problema está na maior área de contato, vantagem em situações dinâmicas, mas que faz jogo duplo ao praticamente ancorar populares de baixa litragem, aumentando o arrasto de rodagem. Sem falar do conforto, tolhido pela menor flexão da borracha.

A baixa qualidade dos pavimentos tupiniquins prega outro susto, já que esses conjuntos estão mais sujeitos a danos do que os convencionais. A repulsa a buracos é levada em consideração pelos fabricantes de pneus. “Como o veículo, o pneu precisa ser tropicalizado. Nossos pneus importados têm que ter uma construção reforçada, com duas camadas na carcaça para suportar as vias daqui”, explica Marcelo Rodrigues, coordenador de marketing de produtos da Goodyear. “Em produção nacional, os pneus mais baixos não são uma tendência forte. O grande volume está no aro 14, seguido dos 15 e 16, enquanto os 13 polegadas dominam o segmento de reposição. Temos uma recomendação de não baixar muito o perfil no Brasil, pois perfis mais baixos são mais suscetíveis a rasgos laterais, provocados em geral pela própria roda”, alerta Antônio Seta, gerente de engenharia de equipamentos originais da Bridgestone do Brasil . No caso, a precaução obedece a um cálculo que multiplica a largura em relação ao perfil. O Fiat Bravo T-Jet, por exemplo, conta com rodas aro 17 polegadas com pneus 205/50. Ou seja, multiplicando 205mm por 0,50, tem-se o resultado de 102,5mm. “O limite para o país fica em 100mm de parede lateral”, completa Antônio. Uma receita para não ficar pelo acostamento.