Lançado originalmente em 1963, o Porsche 911 é um mito de personalidade dividida. Enquanto o 911 normal é um esportivo para o dia a dia, ainda mais rápido na versão S e mais seguro na 4, de tração integral, outras configurações mostram a faceta mais rude do carro. E não estamos falando do mais civilizado Turbo/S ou do GT3/RS, um bólido das pistas com licença para andar nas ruas. O único 911 capaz de ombrear lendas de marcas como Ferrari e Lamborghini é o GT2, ainda mais se for na variante RS, mais leve e veloz. Apresentado em 2010 como o mais rápido e potente Porsche de série da história, o GT2 RS nasceu com ingresso garantido para a série Carros dos Sonhos. Pudera! Com produção limitada a 500 unidades, essa versão tem 90cv a mais que o original, potência equivalente à de um motor 1.4 e 70kg a menos, o peso de um adulto médio. Estamos falando de 620cv a 6.500rpm e 71,4kgfm de torque desde 2.500rpm até 5.500rpm. Bem diferente do GT3, que precisa ir aos 6.750rpm para entregar 43,8kgfm.
Tanta força em baixa rotação se explica pela construção do motor. O seis cilindros plano (boxer) 3.6 tem dois turbocompressores, como no GT2, com turbinas de geometria variável de 1,6 bar de pressão – contra 1,4 bar de antes –, que permite maior torque em baixa. A lubrificação é a cárter seco, o que impede a falta de óleo em curvas muito rápidas, algo comum em um carro capaz de superar 1G nessas situações. Dentro da proposta purista, esse 911 tem tração traseira, dispensando o sistema integral do Turbo. Na mesma linha, o GT2 RS sai apenas com câmbio manual de seis marchas, sem opção do automatizado de dupla embreagem e sete velocidades. Nada disso atrapalha o desempenho. Até os 100km/h passam-se míseros 3,5 segundos. Em 9,8s, bom tempo para um sedã médio chegar aos 100km/h, o superesportivo já cruzou os 200km/h. A máxima é de 330km/h, o mesmo patamar do Carrera GT V10 de 2004, que perdia em aceleração.
LINHAGEM A brutalidade do carro tem explicação em suas raízes. O GT2 apareceu a primeira vez em 1994, ainda como 993, a última geração do 911 equipada com motor refrigerado a ar. E que motor: eram 436cv de um 3.6 biturbo, fôlego explicado pelo fato de o carro ser uma versão de homologação de um 911 de pista, criada em apenas 57 unidades. Ressurgiu como 996 em 1999, já pensado como carro de rua e com o boxer de iguais 3.6 a água, que repetia a sobrealimentação para chegar aos 462cv. A pista já tinha ficado para o GT3, aspirado, de alta rotação e preciso. De 2005 a 2007, os aficionados ficaram sem um GT2, espera que foi aplacada pelo atual 997, dotado de 530cv. Parecia o ápice, mas depois veio o RS para provar que não.
Os vigilantes do peso fizeram o seu trabalho também. Materiais leves como plástico reforçado com fibra de carbono estão por toda parte, dos spoilers dianteiro e traseiro aos bancos em concha. A dieta determinou também que os vidros laterais e o traseiro fossem trocados por policarbonato. Nem a bateria escapou: em vez de uma avantajada bateria de chumbo-ácido, o GT2 RS optou por outra menor, do tipo íons de lítio. As rodas forjadas em aro 19 polegadas de cubo rápido são mais leves do que as fundidas, com pneus 245/35 na dianteira e 325/30 na traseira. Já os freios são cerâmicos, mais eficientes e menos pesados.
Por dentro, o carro se destaca pelo acabamento majoritariamente preto, com toques de couro vermelho do tipo Alcântara, cuja textura acamurçada dá melhor aderência e pegada. Na seção central dos bancos, volante, manopla do câmbio e alavanca do freio de mão. Há opção de luxos, como sistema de som de alta definição e ar-condicionado, mas muitos não optam pelos equipamentos em razão do seu peso. Tudo em nome da balança – e do desempenho.
ESGOTADO Tanto esmero acabou influenciando no preço: na Europa, o GT2 RS custa 164.107 euros, quase o dobro dos 85 mil pedidos pelo 911. Convertendo, seriam R$ 424 mil. Some a isso impostos de importação, uma bela fatia de lucro e ao sobrepreço da exclusividade para chegar ao R$ 1,5 milhão pedido por aqui. Quem disse que isso inibiu alguém? A pressa dos interessados foi tanta quanto o modelo em si: quando o 911 GT2 RS debutou no Salão de São Paulo, em outubro, as cinco unidades reservadas para o país já haviam sido vendidas.