De Curitiba
Este ano, a indústria automotiva brasileira completa 50 anos, atinge também a marca de 50 milhões de unidades produzidas no país e gera forte expectativa de que deve fechar o ano com o recorde de vendas da história, superando 1997, quando foram comercializadas 1,943 milhão de unidades. Foi dentro desse cenário otimista que a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave) realizou o 17º congresso da categoria, reunindo cerca de 2 mil profissionais do setor, do Brasil e América Latina, no último fim de semana, em Curitiba (PR). Um dos temas de grande interesse foram as oportunidades e ameaças das marcas chinesas.
Chineses
Esclarecendo mitos em relação à entrada de automóveis chineses no Brasil, o diretor da Pesquisa Automotiva Asiática na Global Insight, Ashvin Chotai, fez um panorama da indústria chinesa, afirmando que, de maneira geral, não existe evidência sólida de que as marcas chinesas venham a mudar o cenário automotivo em países como o Brasil. Pelo menos não a curto prazo. Embora tenham os mercados de países emergentes como possibilidade de ampliação, as marcas chinesas ainda enfrentarão muitos obstáculos. Segundo Chotai, para se tornar competitivas necessitam de visão global, tecnologia, melhora da imagem e, principalmente, mais qualidade no que diz respeito à segurança.
O mercado chinês é bem fragmentado, formado por 21 montadoras, a maioria de marcas locais, associadas, por meio de joint-venture, a fábricas estrangeiras tradicionais como Volkswagen, Toyota e General Motors. Inclusive, é comum a mesma montadora se associar a mais de uma marca, compondo mais de uma empresa. A marca estrangeira, porém, não pode deter mais de 50% do capital. Há também montadoras de propriedade estatal e as que estão sendo chamadas de nova onda, na qual se enquadram aquelas que começam a ser conhecidas no Brasil ? Chery, Geely, Great Wall, Zhongxing, BYD e China Brilliance ?, que não têm associação com marca estrangeira. Além disso, entram no mercado chinês, marcas totalmente importadas: Jaguar, Porsche e Aston Martin.
Possibilidades
Entre as marcas da nova onda, a Chery é a que mais produz, perto de 430 mil unidades por ano e, segundo o especialista, é a que tem mais visão estratégica do mercado global. Mas ele ainda a considera uma marca fraca. Segundo Chotai, a Chery deverá fazer parceria com a Chrysler, que poderá ajudá-la a se desenvolver. ?Para fazer produtos novos, 2008 e 2009 serão anos cruciais?, diz, lembrando que outra missão da empresa é melhorar a imagem da marca na própria China, que tem preferência por carros estrangeiros. Ele acrescenta que existe a possibilidade de acordo com a Fiat, o que teria forte implicação no Brasil, mas ressalta: ?É atraente para a Chery, mas não sei se necessariamente para a Fiat?. A marca pretende produzir um milhão de unidades até 2012, sendo 400 mil para exportação.
A Geely é uma marca menor, com a ambição de ter 15 novos veículos até 2010, oito motores, 12 transmissões manuais e um carro híbrido. O número de exportações ainda é pequeno e os mercados são Oriente Médio e África do Norte, embora a Rússia esteja se tornando um destino importante, até para a construção de uma futura planta. Em 2006, o sedã CK foi reprovado nos testes de colisão americanos. Então o lançamento nos EUA foi adiado para 2010, quando o GK deverá aparecer. ?Tiveram que voltar para a prancheta e desenvolver um modelo mais trabalhado?, observa o pesquisador.
A China Brilliance também teve problemas de segurança. O modelo BS6 foi reprovado no teste Adac de colisão da Alemanha, obtendo a pior nota já dada em teste semelhante. Assim, a marca terá que rever sua estratégia, sem condições de entrar no mercado europeu num futuro próximo. Os principais mercados são Oriente Médio e Rússia. Já a Great Wall é bem pequena e atualmente produz picapes e utilitários-esportivos, mas, segundo Chotai, ainda tem forte característica de imitação, grave problema da China. A marca tem tentado sentir o mercado brasileiro, mas tem problema de produção em escala e tecnologia.
Chotai acredita, ainda, que, pelo baixo preço, os modelos chineses concorreriam muito mais com os carros usados, o que faria com que passassem a ter preços mais atraentes. Aos revendedores, ele aconselha cautela antes de qualquer acordo com marcas chinesas, o que não significa deixar de cogitar a hipótese: ?Pergunte sobre o valor de revenda, os testes de colisão, de emissões. Veja se a marca poderá sobreviver a longo prazo?, conclui.
Brasil
Embora ainda não seja possível ter noção exata dos efeitos da crise, iniciada pela instabilidade do mercado de imóveis dos Estados Unidos, o presidente da Fenabrave, Sérgio Reze, não acredita em forte impacto no mercado automotivo brasileiro. Segundo ele, pode haver um leve aumento nas taxas de juros, não chegando a prejudicar o crescimento. Uma grande freada só ocorreria se as taxas subirem muito, a ponto de abalar o poder de compra do brasileiro. Na primeira quinzena de agosto foi registrada alta de 3,7% nas vendas de automóveis e comerciais leves, em relação ao mesmo período de julho (99.857 unidades contra 96.164). Se comparado com agosto do ano passado, o índice sobe para 22,6%. A previsão para o ano varia entre os especialistas, que arriscam de 2,2 milhões a 2,5 milhões de unidades. No acumulado, até julho, já foram emplacadas 1,049 milhão de unidades.
(*) Jornalista viajou a convite da Fenabrave.