Na primeira fase da indústria automotiva nacional, o negócio era bem diferente. Diminuto, o mercado era disputado por várias marcas, algumas das quais sumiram do país depois de alguns anos. Uma que fez sucesso e deixou saudades foi a Willys, que mais tarde seria absorvida pela Ford. Mas, antes disso, marcou época com o Aero-Willys. O modelo ganhou livro dedicado especialmente à sua história: Aero-Willys, o carro que marcou época, escrito por José Rogério Lopes de Simone e José Penteado Vignoli. Editada pela Alaúde, a obra conta em minúcias não apenas a saga da criação do três volumes como também o pano de fundo.
É difícil olhar para o sedã repleto de cromados e associa-lo a outro Willys bem-sucedido: o Jeep. Talvez seja porque o maior ponto em comum (o motor seis cilindros em linha de projeto robusto, porém sem pimenta) estava escondido. A Willys chegou ao Brasil em 1952 e tinha feito sua fama com o Jeep e a Rural. De quebra, tinha entrado com os dois pés no segmento de carros de passeio em 1959, quando lançou o Dauphine, depois de associar-se aos franceses da Renault. Só faltava um sedã maior, papel que seria preenchido pelo Aero-Willys.
Aeronáutico
Comparadas a outros projetos do período, as formas relativamente limpas chamam a atenção pelos detalhes, como os vestígios de rabo de peixe, sem heranças do período anterior da Segunda Guerra Mundial. Eram 4,70 metros de comprimento, o que o enquadrava entre os sedãs grandes. Os bancos eram inteiriços, o que abria espaço para seis pessoas. Podia não ser a última palavra em estilo, já que foi lançado em 1952 nos Estados Unidos, mas aqui fez uma presença que não fazia na terra natal.
Lá fora, brigava entre os mais baratos, já no Brasil enfrentou a concorrência refinada de europeus adaptados ao Brasil, como os rivais FNM JK e Simca, feitos aqui desde 1959. O segundo, embora francês, tinha ares ianques e, até mesmo, opção de motor V8. Eram firulas que não combinavam com o Aero-Willys. Só que o modelo tinha algo que valia ouro: a confiabilidade. O motor 2.6 tinha apenas 90cv e câmbio de três marchas, sendo que a primeira não era sincronizada. Até os 100km/h, passavam 24,4s, cerca do dobro do tempo de um sedã médio atual. Para os padrões da época, contudo, o rendimento não era ruim. Além do mais, a mecânica era confiável e, como robustez é fundamental, não tardou para o Aero se tornar líder da categoria, ultrapassando largamente o Simca e o FNM, que vendia pouco.
Enobrecimento
Aos que acham que reestilizações são recentes, o Aero-Willys foi redesenhado e ressurgiu como 2600 em 1963. Mais retilíneo, o modelo ainda mantinha o vestígio de rabo de peixe, que só desapareceria dois anos depois. As reestilizações, aliás, rendem bom caldo no livro, que remonta aos bastidores dos protótipos, incluindo até aqueles que não viram as ruas. Tapas que mantinham o Aero na liderança. O mercado se dividia entre os nacionais de luxo e os importados, que ofereciam mimos até então estranhos. Aproveitando o espaço, a marca lançou, em 1965, o Itamaraty, que tinha requinte até no nome (sugerido pelo publicitário Mauro Salles), uma referência ao palácio do Ministério das Relações Exteriores.
Os que desejavam um carro digno do topo do Poder Executivo, porém, só foram agraciados em 1967, quando foi lançado o Willys Itamaraty Executivo, a única limusine fabricada em série no país. Limusines oferecidas por fabricantes eram raras, como o Mercedes-Benz 600 Pullman e Cadillac Fletwood 75. A montagem da carroceria alongada era feita na Karmann, e incluía duas banquetas no compartimento traseiro, que podia incluir vidro separador. Com apenas 27 unidades feitas, foi o exemplar mais raro desse modelo. Não por acaso, mereceu dez das 160 páginas do livro, ilustradas com detalhes.
Parecia o auge do Aero e Itamaraty, mas a segunda geração de automóveis nacionais começava a chegar, representada por figuras fáceis como o Chevrolet Opala e Ford Corcel. A Ford, aliás, comprou a Willys no mesmo ano do lançamento do Executivo. Restou ao Aero fazer o papel de modelo intermediário, mais barato que o recém-lançado Galaxie. A nova matriz não autorizou reformas no carro, que mantinha a base dos anos 1950. O papel coadjuvante não combinava com o veterano e, em 1971, mesmo depois de retoques, o Aero saiu de linha. Foram 99.621 Aero-Willys e 17.216 Itamaratys vendidos.