Se os amantes das películas escuras já andavam impunes, mediante a impotência dos agentes fiscalizadores, que apenas tinham como parâmetro de verificação do índice de transparência dos vidros os olhos e as chancelas gravadas no conjunto vidro/película, quase sempre adulteradas; agora têm a seu favor um perigoso aliado: a falta de interesse público.
Desde 1º de julho do ano passado que o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), pela Portaria 391, homologou o aparelho Translux II para medição da transmitância luminosa (quantidade de luz que passa pelo vidro), autorizando a aquisição do equipamento pelos órgãos de trânsito de todo o Brasil, para uma fiscalização segura do uso das películas. A homologação era ansiosamente aguardada desde novembro de 2007, quando foram publicadas as resoluções 253 e 254 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), normatizando a fiscalização e o uso das películas, que passou a ser indiscriminado no Brasil, pois só o equipamento específico é capaz de atestar o real teor de luminosidade que passa pelos vidros. Por lei, a transmissão luminosa não pode ser inferior a 75% para os vidros incolores dos para-brisas e a 70% para os para-brisas coloridos e vidros laterais dianteiros. Já os traseiros (laterais e traseiro propriamente dito) podem ter transparência mínima de até 28%.
O problema é que, aprovado o equipamento, os órgãos de trânsito não demonstram interesse em adquiri-lo e, segundo o Denatran, uma vez designado equipamento hábil para a medição, a fiscalização não pode mais ser feita pela verificação da chancela no vidro (marca que atesta o índice de transparência do conjunto vidro/película). E nem todas as autoridades parecem saber disso.
A repórter Ana Cristina Pimenta conta mais sobre a fiscalização da película automotiva:
LICITAÇÃO A Polícia Rodoviária Federal (PRF), em Minas, informa que ainda não foi feita licitação para aquisição do aparelho e que não há data prevista para isso. E que a fiscalização continua sendo feita pela chancela. A Polícia Militar Rodoviária também diz que ainda não há processo aberto para a compra e que o ideal seria esperar o uso e aprovação do equipamento pela PRF para só depois dar início a sua própria aquisição.
Já o Batalhão de Trânsito da Polícia Militar, responsável pela fiscalização dentro de Belo Horizonte, demonstra preocupação pela falta do aparelho, e é o único a mostrar maior conhecimento da lei, afirmando que a fiscalização fica suspensa até sua aquisição. No entanto, segundo a corporação, mesmo a chancela não sendo o parâmetro usado, em caso de essa não existir, o veículo pode ser retido para regularização. Mas, quando a reportagem é direcionada ao setor responsável pela compra do equipamento, a informação é apenas de que, “se o aparelho tiver mesmo sido homologado, será feita a aquisição”.
Mais temerosa é a resposta do Detran-MG, responsável pela vistoria de todos os veículos usados, quando transferidos de propriedade, situação em que deveria ser verificado o uso das películas. Conforme a assessoria de imprensa, a verificação continuará a ser feita como antes, apenas olhando e comparando os diversos tipos”, já que “não há obrigatoriedade para a aquisição do aparelho”.
OBRIGATÓRIO Questionado sobre tal obrigatoriedade de aquisição do equipamento pelos órgãos de trânsito, incluindo os Detrans, o Denatran responde que “desde outubro de 2007, com a publicação das resoluções 253 e 254, a medição das áreas envidraçadas para efeito de fiscalização deve ser feita por meio de medidores de transmitância luminosa, que precisam ser aprovados pelo Inmetro e homologados pelo Denatran (o único por enquanto é o Translux II) e não mais por meio da chancela”. E que “para cumprir uma das suas competências, que é fiscalizar as infrações previstas no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o que inclui a película, é necessário que o órgão de trânsito disponha de todos os meios para o cumprimento de suas atribuições”.
CURIOSIDADE Enquanto os órgãos que efetivamente fiscalizam não compram o equipamento, em Belo Horizonte, a BHTrans informa que adquiriu uma unidade, com o objetivo de medir a transparência da publicidade no vidro traseiro dos táxis. Por ser uma empresa de economia mista, a BHTrans não pode fiscalizar e multar os veículos de maneira geral, obrigação dos órgãos citados acima.