Charutos, rum, cha-cha-cha... e carros enferrujados. Poderia parecer uma combinação esquisita em qualquer outro país, mas são alguns dos elementos que se fundem em Cuba. Só que uma das tradições está ameaçada: a dos carros pré-revolução. E não é a ferrugem que os ameaça desta vez, e sim a liberação das vendas de automóveis no país, promulgada em 28 de setembro. O embargo vai cair de vez em 2012, como uma das partes da renovação prometida pelo irmão de Fidel, Raul Castro. Agora, qualquer cubano e residentes estrangeiros podem fazer o que quiserem com os seus carros sem autorização prévia, algo simples, mas que era proibido há 50 anos. Os calhambeques começaram a trocar de mão e decidimos falar mais sobre a fauna que roda pelas ruas da ilha caribenha.
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SE VENDE As reformas foram também pedidas pela população. Antes mesmo do fim formal do embargo, em 14 de setembro, esse Dodge Coronet 1958 já desfilava com a nada discreta inscrição Se vende diante do bulevar El Malecon, em Havana. Não que isso fosse proibido, mas exigia uma difícil autorização prévia antes de anunciar o seu possante. E não foram só os carros, não: a população também vai poder vender suas casas livremente. Outra mudança foi a expansão do setor privado reconhecido pelo Estado, antes restrito a 143 mil profissionais, incluindo um sem-número de mecânicos que trabalham em oficinas precárias ou até mesmo na rua.
DE ONDE A história com os carros americanos não é uma questão de gosto. Após a revolução de 1959 e os seus desdobramentos, os Estados Unidos impuseram um embargo, que vem desde 1962. Daí o fato de a frota não ter sido renovada. A maioria dos antigos é americana, mas tem
carro de toda parte, como esse Messerschmitt KR200 de 1957, verdadeiro scooter cabinado feito entre 1955 e 1964, flagrado em Havana. O triciclo foi importado na ocasião e, como outros antigos, sobrevive em bom número: 36 unidades. Para se ter uma ideia, no gigantesco mercado americano sobraram apenas 16, e na Alemanha cerca de 100.
SOVIÉTICOS É claro que os cubanos recorreram à União Soviética, nova aliada, e desse relacionamento vieram alguns automóveis junto, todos oriundos do bloco. É o caso desse Moskovitch 2138, que ganhou todo o jeito de carro europeu preparado dos anos 1960, com direito a capô e tampa do porta-malas em preto fosco e rodas de liga leve.
ABASTADOS E quanto aos oficiais e outras autoridades? Bem, esses andam em coisa melhor, como mostra esse oficial parado junto a um dos carros designados do antigo palácio presidencial, agora Museu da Revolução. Como em outros países, o alto escalão de Cuba não dispensa os Mercedes-Benz, como bem prova o Classe E da foto.
CHINESES Mas a queda do muro veio e Cuba ficou sem ter de onde trazer seus carros. As importações limitadas até deixavam uma ou outra brecha, para esportistas, autoridades e estrangeiros. É o que ajuda a explicar esse Moskvitch desconsoladamente parado ao lado de um reluzente BMW Série 5 na capital. Contudo, as exceções ainda são raras. De 2009 para cá, com o fortalecimento da relação entre Cuba e China, alguns modelos chineses começaram a ser usados como táxis, carros de aluguel ou veículos oficiais. É o caso desse Geely CK da Polícia Revolucionária Nacional, com a câmera 360 graus no teto.
HÁBITOS A abertura em Cuba já dá espaço não apenas a carros novos, como também a outros hábitos culturais. Foi o que provou o casamento, em 13 de agosto, do ativista dos direitos gays Ignacio Estrada e o transexual Wendy Iriepa, que não apenas uniram-se como também desfilaram com todo orgulho sobre um Ford Fairlane conversível. Com direito a bandeira do arco-íris e tudo.