Mineiro de Muzambinho, o jornalista Márcio Bueno sempre foi um apaixonado pelas palavras: como elas surgiram? De onde vêm? Depois de sete anos de estudos e pesquisas em diversos dicionários etimológicos, em português, alemão, inglês, francês, italiano e espanhol, descobriu que algumas histórias que ouvia sobre o surgimento de determinados termos eram fantasiosas e decidiu escrever um livro sobre o assunto. O resultado é realmente curioso. Algumas palavras ligadas ao mundo do automóveis, e por ele selecionadas, com certeza, mostram a riqueza do trabalho de investigação do autor.
Barbeiro
(...) Chama-se barbeiro também o mau motorista ou profissional inábil em qualquer atividade. E qual é a razão? Já se sabe que os barbeiros não se limitavam a fazer barba, cabelo e bigode. Antigamente, o médico prático, que fazia pequenas cirurgias, ficou conhecido como 'cirurgião-barbeiro', por ser um profissional que acumulava as duas funções. Em Portugal, até o fim do Século 19 ainda se misturavam cursos de cirurgião-barbeiro. Dada a falta de estudos mais aprofundados em área tão complexa como a medicina, não é difícil imaginar a quantidade de equívocos que eram cometidos. Manipular ora a navalha, ora o bisturi não devia dar resultados lá muito satisfatórios. Segundo alguns autores, essa é a razão pela qual o termo acabou incorporando o sentido de 'profissional incompetente, sem habilidade'. (...)
Camburão
É um termo que designava antigamente, no Ceará, o recipiente ou vaso usado pelos presos durante as faxinas, para carregar as fezes. Depois, passou a denominar viatura policial, utilizada no transporte de presos. É possível que tenha sido feita uma certa analogia - politicamente incorreta - entre fezes e presos. (....)
Caminhão
A origem é o francês camion, termo que foi adaptado na língua portuguesa para 'camião', sendo mantido com essa forma até hoje em Portugal. Os povos de língua espanhola apenas adicionaram à palavra um acento agudo: camión. No Brasil, houve uma evolução interessante, segundo alguns autores. Como o veículo se prestava a transitar pelos caminhos, esse termo acabou exercendo influência sobre 'camião', o que resultou na forma 'caminhão'. Em francês, o diminutivo de camion é camionette (pequeno caminhão), que, no Brasil, foi adaptado para 'camionete' e, por influência de caminhão, também para 'caminhonete'.
Funileiro
No estado de São Paulo, o termo funileiro é empregado no sentido de 'profissional especializado em consertar ou reformar a lataria de automóveis'. A oficina em que trabalha é a funilaria. Brasileiros de outros estados, principalmente cariocas, costumam brincar com os paulistas: "Por que 'funileiro', se o que ele conserta não é funil?" Em outras regiões do Brasil, o mesmo profissional é chamado de ?lanterneiro?, o que leva os paulistas a fazer o mesmo tipo de indagação: "Por que 'lanterneiro', se o que ele conserta não é lanterna?" O funileiro era, antigamente, apenas o fabricante de funil e, depois, o termo passou a designar o profissional que trabalha com lataria em geral, com folha-de-flandres etc. Certamente, os primeiros a trabalhar na restauração das carrocerias ou lataria dos automóveis foram esses profissionais, daí a razão do nome.
Jardineira
Entre outros usos, o termo designa alguns tipos de ônibus que circulam no interior e na zona rural. O que pode parecer estranho, já que em princípio não existe relação entre flores e veículo de transporte. (...) Os agricultores ou produtores de hortaliças francesas chamavam de jardiniére (jardineira) um veículo de duas ou quatro rodas que usavam para transportar a produção agrícola de seus jardins para os mercados das cidades. Na Itália, o mesmo veículo era chamado de giardiniera. Mais tarde surgiu uma carroça de quatro rodas, puxada a cavalos, descoberta e com bancos laterais para transportar passageiros. Esse tipo de carro esteve muito em voga no início do século 20 e herdou o nome do veículo dos agricultores tanto na França (jardiniére) quanto na Itália (giardiniera) e Espanha (jardinera). Depois disso, o nome é aplicado, igualmente pela semelhança, a um tipo de veículo de transporte coletivo, movido a combustível, com bancos paralelos transversais, que começou a ser fabricado por empresas automobilísticas. Na língua portuguesa, a denominação só é usada no Brasil e chegou com imigrantes italianos ou espanhóis.
Lanterneiro
O termo é usado no sentido de profissional especializado em consertar ou reformar a lataria de automóveis. (...) De acordo com a versão mais plausível, o termo passou a ter esse uso no tempo em que os carros andavam a uma velocidade muito baixa e, quando batiam, no máximo quebravam ou amassavam as lanternas. (...)
Limusine
Automóvel de passeio de luxo, inteiramente fechado e de grandes dimensões. A origem é o francês limousine, que primitivamente designava uma capa de tecido grosseiro, usado por pastores. E a capa tem esse nome por ser da região francesa de Limousin, cuja sede é a cidade de Limoges. Outra hipótese: o criador desse tipo de carroceria, Charles Jeantaud (1843-1906), teria chamado o invento de limousine, em homenagem à região em que nasceu.
Sedã
Vem do inglês sedan, uma redução de sedan-chair, nome da liteira, espécie de cadeirinha fechada e coberta, que era apoiada em dois varais e transportada por homens ou animais. Na língua inglesa, quando surgiu o automóvel fechado, a semelhança fez o tipo de veículo passar a ser chamado de sedan. Na França, há uma cidade denominada Sedan, que foi uma grande fortaleza em séculos passados. Por ser fechada, poderia ter cedido o nome à liteira, mas etimólogos da língua inglesa passam ao largo dessa possibilidade. Para o etimólogo E. Partridge, a palavra, em inglês, tem origem no latim sedes (assento, banco), relacionado com o verbo sedere (estar sentado).
Van
Veículo motorizado e fechado, semelhante a um furgão, usado no transporte de passageiros ou adaptado para comércio ambulante; perua. A origem é o inglês van e, na língua inglesa, o termo provém de caravan (caravana). Em inglês, a forma reduzida van começou designando vagão de estrada de ferro, certamente pela idéia de caravana, ou comboio. Mais tarde, a palavra passou a designar veículo fechado, usado como habitação sobre rodas - a van brasileira vem provavelmente dessa última utilização, pela semelhança entre os veículos.