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Entrevista/Jucelino Sousa - No rastro dos automóveis

Mercado de combustíveis busca mais crescimento, mas espers correção de distorções

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Para Jucelino Sousa, informalidade na venda do álcool camufla desempenho do setor

Seguindo a boa fase por que passa a economia brasileira e a indústria automotiva, o mercado de combustíveis cresceu 8% no país em 2007. Mesmo índice que pode ser alcançado este ano, na opinião do diretor vice-presidente da AleSat, Jucelino Sousa. Em entrevista ao caderno de Veículos do jornal Estado de Minas, ele fala também de adulteração e sonegação de impostos, carros flex e biodiesel.

O mercado de combustíveis cresceu bastante. O principal motivo foi o aumento da frota de veículos?
Teve acréscimo de 8%, bem acima do Produto Interno Bruto (PIB), que cresceu 5,4%. Isso muito puxado não só pelo aquecimento da economia, mas por esse verdadeiro boom por que passa a indústria automotiva. Mas o que a gente interpreta é que o crescimento deve ter sido maior, pois sabemos que existe um mercado informal, principalmente na venda do álcool, que não é contabilizado nos números oficiais da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Embora ano passado tenha havido uma melhora com relação a essa informalidade, acho que os números refletem apenas 60% da realidade. Cerca de 40% da venda de álcool estão na informalidade.

Que medidas foram tomadas para isso para reduzir essa informalidade?
Algumas medidas corretivas, mas que não resolvem todos os problemas. O crescimento do álcool teve algumas motivações: primeiro, a econômica; segundo, a entrada dos carros flex, que hoje representam 85% das vendas; e o crescimento da frota. Entre as medidas que citei estão a redução do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), em São Paulo, e a proibição de venda para outras bandeiras.

Qual é a expectativa para este ano?
É positiva. O mercado tem todas as condições para repetir o sucesso do ano passado e crescer mais 8%. Mas esperamos algumas medidas por parte das autoridades. A transferência de tributação do PIS/Cofins do álcool hidratado para as usinas (e não mais pelas distribuidoras), uma proposta que está em tramitação no Congresso, deverá inibir a prática de sonegação, diminuindo mais a informalidade. Há tendência à diminuição da bandeira branca. Hoje os postos sentem a necessidade de ter a marca de uma distribuidora como parceira, não só pela confiança, mas pela qualidade do produto e pelo crescimento das exigências ambientais para a adequação dos estabelecimentos. Alguns têm dificuldade nessa adequação e a parceria com as distribuidoras auxilia.

Há temor em relação aos postos bandeira branca porque os preços são mais baixos. Isso, de fato, é indício de adulteração ou sonegação de impostos?
As grandes diferenças de preços são o atrativo do posto bandeira branca. E a questão é que os preços são muito parecidos, pois o fornecedor é o mesmo. No que diz respeito à gasolina e ao diesel é a Petrobras. E com relação ao álcool, há várias usinas, mas os preços também estão mais equilibrados. Então, há grandes indícios. Só adulteração ou sonegação para justificar preços tão baixos, pois não há milagre.

Como a Ale monitora a qualidade do combustível nos postos?
Temos um programa de qualidade, com visitas freqüentes, e há marcadores químicos que permitem rastrear se, de fato, saiu das bases. Caso seja identificada alguma não-conformidade, há cláusulas contratuais que nos permitem chamar o posto à responsabilidade. Mas isso não é comum. Existem, às vezes, casos de não-conformidade, por situações alheias aos revendedores. Por exemplo, chove, o tanque está mal lacrado e entra água. O revendedor não fez de forma dolosa. Mas é claro que às vezes existe de fato o dolo, o desejo de adulterar para se ganhar demasiado. Mas o índice de não-conformidade é inferior a 2%. O problema é que a ANP não separa isso em suas estatísticas. Em alguns casos, a gente consegue identificar. Outros são mais complexos. Um caso de solvente na gasolina, por exemplo, não é como água de chuva. Alguém colocou.

Recentemente, foram pegos donos de postos que usavam bombas flex, que misturavam o álcool na gasolina, que é mais cara…
Isso aconteceu em São Paulo. Em Minas, desconheço. É crime. São ações planejadas e de difícil execução. Pois há dois reservatórios e dois tanques, e para propiciar essa mistura é necessário contato subterrâneo. Isso não é simples nem barato de se fazer, mas, por outro lado, difícil de ser descoberto. É necessária fiscalização eficiente. Já o consumidor pode exigir a análise do produto no posto. Pode, inclusive, pedir a amostra e encaminhá-la ao órgão competente.

Como a Ale vê o programa de biodiesel?
Este ano começou a exigência de adição de 2%, que no meio do ano deverá passar para 3%. Vemos com muito otimismo, mas com certa preocupação, pela falta de fiscalização e de uma regulamentação bem feita para o produto. Por exemplo, as distribuidoras podem não adicionar o biodiesel no diesel, se não houver fiscalização, pois o biodiesel é mais caro. E também temos preocupação em relação à qualidade dos produtos, que são matérias-primas possíveis de especificação. Também precisa ser bem fiscalizado.

Em Minas, o preço do álcool ainda não é compensador, como ocorre em São Paulo, por exemplo…
Mas é um dos mercados em que o consumo do álcool mais cresceu (60%) em 2007. Mas o álcool representa 18% do consumo (de álcool em relação à gasolina), enquanto em São Paulo é 44% e, até o meio desse ano, já deve ultrapassar a gasolina. Mas há vários fatores. Um é o ICMS, que lá é 12%, enquanto aqui é 25%. O álcool é mais vantajoso quando o preço é até 70% o da gasolina. Em São Paulo, o preço médio do álcool nas bombas equivale a 54% do preço da gasolina. Mas lá existe também a questão da proximidade com as usinas e uma logística mais eficiente. Veja só, este ano Minas Gerais vai produzir 1,7 bilhão de litros de álcool e o consumo é de apenas 600 milhões de litros. Há espaço para consumo muito maior de álcool.

Ano passado houve queda nos preços. É possível diminuírem mais?
Em comparação com 2006, os preços do álcool caíram 20% ano passado. Esse ano ainda estamos no período em que a safra está começando, o que gera impacto no preço. Mas espero que ainda caia mais, pois a oferta é maior que a demanda. O que pode mudar essa realidade é a proposta de mudança tributária, com a transferência de cobrança do PIS/Cofins nas usinas. Isso vai gerar aumento nas alíquotas. Com relação à gasolina e ao diesel, depende da Petrobras. Teoricamente, com a escalada dos preços do petróleo, já deveria ter havido um reajuste, que não houve. E o outro lado compensa, que é a queda do dólar. Se eu tivesse que apostar, diria que também não sobem.

Mas o diesel, devido à adição do biodiesel, não terá preço mais alto?
Aí que está. Pode haver ajuste em função disso. Hoje, o custo é entre meio e um centavo, caso o preço do biodiesel permaneça nos patamares em que está. Mas são elevados os custos de produção e também há o encarecimento da soja, que é a principal matéria-prima. O programa do biodiesel é extremamente elogiado e o Brasil pode ser auto-suficiente. Mas é preciso haver um equilíbrio já que é uma atividade nova, ainda sem escala de produção. Com o álcool foram necessários uns bons 15 anos para haver total equilíbrio e auto-sustentabilidade. E foi subsidiado pelo governo, coisa que o biodiesel não é. Não estou dizendo que teria que ser (ou não), mas só que é difícil prever. E não basta a obrigatoriedade, há uma série de fatores que influenciam. Em menos de cinco anos, esse produto não estará consolidado.

Olhando o gráfico de crescimento das distribuidoras de combustíveis, ano passado, há discrepância em relação à venda de gasolina e álcool…
É. No que diz respeito à gasolina, a maior participação, da Petrobras, foi de 25,5%; a da AleSat, de 5,8%. Mas quando você vê o quadro da venda de álcool, a participação da Petrobras é de 18,2%; a AleSat nem aparece, enquanto têm boa participação as marcas Tux (2,9%), Petromarte (2,8%), Florida (2,7%), que nem aparecem na venda de gasolina. Há alguma coisa errada. O que justifica venderem álcool e não gasolina é o melhor preço. Mas como têm melhor preço? Isso é visível, está aí, nos gráficos. As autoridades só não tomam uma medida se não quiserem. E mais, esses postos só atuam em São Paulo.