Depois de quase dois anos de análises e perícias técnicas, foi constatada a existência de defeito no conjunto do cubo da roda do Fiat Stilo, cujo desprendimento causou vários acidentes, inclusive com mortes. A conclusão foi divulgada, ontem, pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), órgão do Ministério da Justiça, que investigava o caso desde junho de 2008, depois de denúncias de consumidores, divulgadas por Veículos a partir de maio do mesmo ano. A Fiat foi multada em R$ 3 milhões, multa máxima prevista pelo Código de Defesa do Consumidor, por ter negado a existência do defeito e colocado em risco a segurança dos consumidores. E terá que fazer o recall em todos os modelos Stilo fabricados depois de abril de 2004, substituindo os cubos das rodas traseiras por outros fabricados em aço forjado.
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O processo administrativo, instaurado pelo DPDC em junho de 2008, foi analisado em conjunto com o Grupo de Estudos Permanentes de Acidentes de Consumo (Gepac), do qual fazem parte, além DPDC, o Ministério Público Federal dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, além do Distrito Federal, o Ministério Público Estadual de São Paulo, a Fundação Procon ? SP, o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Durante a investigação, foram acrescentados ao processo cerca de 30 acidentes ? muitos deles levantados por Veículos ?, envolvendo desprendimento da roda, entre 2007 e 2008, com modelos fabricados de 2004 a 2008. Dentre os casos analisados, oito foram selecionados pela existência de indícios de defeito, e, curiosamente, nenhum dos veículos tinha sistema de freios ABS.
Durante a investigação, segundo o DPDC, o Gepac realizou audiências com consumidores, mapeou acidentes, aprofundou análises, procurou especialistas, buscou peças de veículos acidentados. Foram ouvidos, além dos proprietários dos veículos, superintendências regionais da Polícia Rodoviária Federal, institutos de criminalística e delegacias de polícia. Foram realizadas aproximadamente duas diligências por semana. Representantes da Fiat participaram de audiências com os órgãos que compõem o Gepac e acompanharam todas as análises técnicas realizadas. Ainda de acordo com o DPDC, o fabricante de Betim se manifestou no processo 13 vezes, juntou laudos técnicos e centenas de páginas de documentos, nos quais afirmou categoricamente e reiteradas vezes que não havia defeito e, por essa razão, não haveria necessidade de realização de recall. A montadora também alegou que o desprendimento das rodas era conseqüência dos acidentes e não sua causa.
Foi então constituída uma comissão de peritos, composta por representantes do Ministério Público Estadual de São Paulo, Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e o parecer técnico do grupo concluiu que havia indícios de defeito, mas o laudo não foi conclusivo. O assunto foi encaminhado do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), tendo em vista a competência do órgão para controlar e fiscalizar o padrão de segurança dos veículos expostos ao consumo. Depois de conclusão das análises, o Denatran encaminhou ao Gepac parecer técnico pela existência de defeito e necessidade de que a Fiat efetue o recall.
A decisão, porém, de acordo com o presidente da Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor, promotor Rodrigo Terra, leva em conta dois pontos importantes. Primeiro: a montagem da roda traseira, que levaria a sua soltura, e teria provocado os acidentes. Segundo: a questão da roda se soltar em acidente, propriamente dita. Conforme o promotor, independentemente de ser causa dos acidentes, o fato de uma roda soltar em acidente representa grave risco à segurança, o que por si só já geraria o recall. "A roda deve ser ficada no eixo de tal forma que não se solte, mesmo após acidente. É como os retrovisores, nos testes de impacto devem se manter fixos", afirma.
Processos
Como se trata de uma decisão de primeira instância, a Fiat pode recorrer à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, mas, por outro lado, está sujeita a outros processos, caso se negue a realizar o recall. "Este foi um processo com duração superior à média e contou com 13 manifestações da Fiat. Foi um trabalho muito profundo e chegou-se à conclusão de que há o defeito. E a multa é exatamente pelo fato de a Fiat não ter convocado o recall", afirma Rodrigo Terra. Ele explica que a partir da decisão do DPDC cabe, agora, à Fiat, convocar o recall. Porém, caso isso não seja feito, a montadora poderá ser obrigada a fazê-lo, por meio de ação coletiva. "Nesse caso, a Fiat poderia, inclusive, ser obrigada liminarmente a parar de produzir o veículo", acrescenta.
Por não ter convocado o recall e ter continuado a produzir o veículo com defeito, a Fiat também responde a processo administrativo no Procon-SP. Além disso, segundo Rodrigo Terra, o DPDC, junto com outros órgãos de defesa do consumidor, pode processar a empresa por danos morais coletivos, objetivando reparar todo o dano material e moral causado até o momento, não só às vítimas conhecidas como pelo risco gerado a outros consumidores no período.
Resposta da Fiat
No fim da tarde de ontem, a Fiat informou que "cumprirá a inusitada decisão do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), que a surpreendeu, e determinará em breve a realização de recall para a substituição do cubo da roda traseira do Fiat Stilo, nos casos em que o veículo se enquadrar na decisão dos órgãos oficiais. A empresa reitera, entretanto, que os modelos Fiat Stilo não apresentam qualquer inconveniente nem risco ao consumidor, conforme sustenta laudo técnico elaborado por sua área de Engenharia, confirmado pelo Inmetro e outras instituições técnicas. Com base nesta convicção, a Fiat Automóveis informa que tomará, de imediato, a providência de recorrer da decisão nas esferas competentes, em busca do pleno esclarecimento dos fatos. A decisão do DPDC se baseou em laudo da empresa CESVI, contratada pelo Denatran ? Departamento Nacional de Trânsito, do qual a Fiat não teve conhecimento prévio nem oportunidade de manifestar-se. A Fiat discorda totalmente do referido laudo e da decisão do DPDC".
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