Motivo de polêmica, discussões judiciais e análises técnicas, desde a sua edição, há quase três anos, a Resolução 245, do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), que torna obrigatório, nos veículos novos, equipamento antifurto (na prática traduzido pelos bloqueadores e rastreadores via satélite), sofreu nova alteração no início deste ano, mais uma vez, às vésperas de passar a valer. Um dos motivos do novo adiamento, segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), foi a necessidade de mais tempo para a conclusão de testes, no que diz respeito ao funcionamento dos equipamentos, encabeçados pelo próprio departamento. Mas segundo o Ministério Público Federal de São Paulo, autor de ação civil pública que questiona a resolução, nem teria como a lei entrar em vigor, uma vez que seus efeitos estão suspensos por liminar.
A ação, que tramita na 7ª Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo, é de março de 2009 e já foi motivo de várias alterações na Resolução 245. No entanto, as decisões que constam no processo até o momento evidenciam que o Denatran ainda não fez cumprir claramente as determinações judiciais. Uma das maiores preocupações diz respeito ao fato de o veículo poder ser rastreado, independentemente da vontade do proprietário, violando o direito à privacidade e incorrendo na possibilidade de dar ao Estado a prerrogativa de desenvolver um banco de dados sobre usuários de veículos e seus deslocamentos e abrindo precedentes para o rastreamento com outro propósito, que não o da segurança pública. De acordo com as decisões que constam no processo, o simples fato de o Denatran deixar de exigir o rastreamento do veículo (ficando a ativação desse serviço à escolha do motorista), mas manter a obrigatoriedade da função de bloqueio, não resolve a questão, já que, mesmo inativo, o rastreamento é tecnicamente possível.
Além disso, é questionado o ônus da segurança pública, transferido ao consumidor; assim como os ônus do próprio custo do equipamento. Por esses motivos, em novembro do ano passado, foi mantida a liminar que proíbe o Denatran de obrigar a instalação dos equipamentos, ao mesmo tempo sendo designada audiência pública para janeiro, da qual participaram representantes de todos os setores envolvidos, inclusive montadoras de veículos. Como não houve acordo, foi dado prazo para todas as partes se manifestarem e atualmente o processo se encontra concluso para sentença, ou seja, aguarda nova decisão judicial.
Minas
Também no estado, ação civil pública impetrada pela Associação Brasileira de Consumidores (ABC), contra a União, pede a suspensão da nova lei. A ABC obteve liminar, deferida pela juíza Ângela Maria Catão Alves, da 11ª Vara da Justiça Federal, de Belo Horizonte, em julho do ano passado, desde quando os efeitos da resolução estão suspensos, a princípio em âmbito estadual. Na decisão, a juíza sustenta, entre outras coisas, que a segurança pública é dever do Estado, sendo descabido onerar o consumidor, uma vez que fatalmente os veículos ficarão mais caros em virtude dos rastreadores.
Testes
Enquanto isso, o Denatran dá continuidade à operação assistida, iniciada em agosto, exatamente quando a resolução deveria entrar em vigor. Os testes deveriam ter sido concluídos até 31 de janeiro deste ano, véspera do novo prazo para valer a obrigatoriedade dos equipamentos, mas foram prorrogados até 31 de julho. Cerca de mil veículos, incluindo automóveis, motocicletas e caminhões, circulam, em todo o Brasil, com o dispositivo antifurto, sendo dirigidos por consumidores convidados e funcionários dos fabricantes de veículos. Em avaliação, estão todo o funcionamento, desde o sinal captado pelo satélite (GPS) ao serviço de monitoramento, passando pela prestação de serviço das empresas de telefonia celular, responsáveis pela devolução do sinal.
Segundo o Denatran, ainda não é possível antecipar resultados, já que cada montadora está desenvolvendo seu sistema. Mas a expectativa é de que todos os fabricantes de veículos deverão estar aptos a produzir e comercializar 20% da frota de modelos zero-quilômetro com o equipamento, a partir de 1º de julho, para atender ao novo cronograma.
Fabricantes
O caderno de Veículos do Estado de Minas entrou em contato com as montadoras instaladas no país, com o objetivo de saber o andamento dos testes, custo etc. A Toyota informou que está se preparando para cumprir a legislação e que irá atendê-la. E considera ser eficiente a instalação de um equipamento bloqueador, com caráter preventivo quanto ao furto; enquanto o rastreador, que atua de forma reativa, localizando o veículo, funciona depois que este já foi furtado. Para a Toyota, a escolha do equipamento deve ser do proprietário do veículo. A Renault afirmou que está preparada para, a partir de 1º de julho, atender a lei, instalando o equipamento em mais de 20% dos modelos. E a Nissan apenas comentou que o assunto está sendo discutido pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), não tendo como entrar em detalhes.
A GM disse que também está pronta para cumprir a resolução, porém aguarda decisão do processo movido pelo Ministério Público Federal de São Paulo. A Honda informou que atenderá às exigências, porém disse que seria necessário haver melhor definição sobre o tipo de equipamento a ser instalado. Ainda segundo a montadora japonesa, como se trata de instalação em veículos novos, certamente haverá reflexos logísticos e de custos na fábrica que, proporcionalmente, terão impacto maior sobre os produtos de menor valor.
Legislação
O novo cronograma, que prevê que a partir de 1º de julho 20% da frota de veículos zero já deve sair de fábrica com o equipamento antifurto, faz parte da Deliberação 90/2010, referendada semana passada pela Resolução 343. Ambas podem ser acessadas pelo site www.denatran.gov.br.