UAI

Polêmica - Você é um marginal?

Legislativo apresenta projeto de lei que nivela todos os motociclistas a possíveis criminosos, obrigando-os a transitar com inscrição da placa no capacete e no colete

Publicidade
Foto:

O vertiginoso aumento da frota de motocicletas no Brasil está criando situações inusitadas. A ineficácia dos transportes coletivos nos grandes centros fez as vendas das motos populares saltarem para a estratosfera, criando também novas categorias profissionais, como as dos motoboys e motofretes. Já no interior do país surgiram os mototaxistas. Todo esse enorme contingente - só este ano serão mais de 1,6 milhão de motos novas - despertou também a imaginação dos legisladores, que criam novas regras de conduta e comportamento para tentar disciplinar o fluxo cada vez maior de motos no trânsito.

Um exemplo é a deputada federal Rose de Freitas, do PMDB do Espírito Santo, que apresentou o Projeto de Lei 7.455 de 2006, que modifica o Código de Trânsito Brasileiro, obrigando os condutores de motocicletas a transitarem com as letras e números da placa da moto grafados no capacete. Para reforçar, também deveriam usar um colete, também com a placa da moto em destaque. A desobediência seria considerada infração gravíssima, sujeita a multa, sete pontos no prontuário e apreensão da motocicleta e da carteira de habilitação.

Justificativa
A deputada federal, em sua justificativa, alega que a medida visa coibir o crescente número de assaltos com o uso de motocicletas, especialmente no trânsito congestionado. A agilidade da moto para empreender fuga facilita a prática delituosa. Com o piloto identificado, o problema estaria resolvido, já que o meliante não se arriscaria.

Na verdade, o que a deputada fez foi nivelar todos os motociclistas, sem distinção, como marginais em potencial, em função de uma ínfima minoria. Aliás, na Câmara dos Deputados tramitaram vários outros projetos nesse sentido, alguns exigindo, além da placa no capacete, os números do chassi e da carteira de habilitação, o nome do piloto e até um código de barras, inclusive para o passageiro.

Em 15 de agosto, o relator do processo na Comissão de Viação de Transporte, deputado Gonzaga Patriota, do PSB de Pernambuco, recomendou a rejeição da proposta e das demais na mesma linha, fazendo valer o bom senso. As razões não poderiam ser diferentes. Segundo Patriota, a medida seria completamente inócua, como se os simples números grafados no capacete intimidassem os possíveis marginais, que só pela força do espírito da lei não mais adulterariam placas e capacetes, nem roubariam motos para praticar novos assaltos. A medida representaria custos adicionais de confecção de coletes, de pintura dos números, sua normatização, fiscalização e muita burocracia adicional.

Mas, e se o piloto trocar a moto? E se emprestar a moto? Teria que também emprestar o capacete, objeto de uso pessoal? E nas empresas com grande frota de motos o piloto teria que ter um capacete para cada uma? E em caso de dano no capacete? Teria que ficar parado? E, nas cooperativas de mototáxis pelo interior, o piloto e moto ficariam vinculados? E se fosse prestar um socorro? As situações se multiplicam. Além disso, e os assaltos praticados com carros ou a pé? A deputada teria ficado míope para esses casos? Agora, o projeto de lei segue para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, onde, espera-se, seja sepultado de vez.