Lançado em 2003, o carro flex completa 10 anos sem muito a comemorar.
Por que flex? Porque o etanol faltou nos postos no fim da década de 1980, uma ducha de água fria no Proálcool, plano que levou quase 100% dos automóveis brasileiros a queimar só o combustível derivado da cana. O carro a álcool caiu em desgraça e deixou de ser fabricado na década de 1990.
A solução “quebra-galho” para convencer o brasileiro a voltar ao etanol foi o flex: se ele voltasse a faltar, era só encostar na bomba de gasolina. Vantagem que trouxe desvantagens a reboque.
Em primeiro lugar, o motor flex funciona com dois combustíveis, mas mal com ambos: a necessidade de ser flexível impediu que os engenheiros o desenvolvessem de forma a obter máxima eficiência energética. A desvantagem vai direto para o nosso bolso, pois o consumo do carro flex supera o dos modelos “pré-flex”, seja com gasolina ou com etanol.
Ainda não se resolveu satisfatoriamente também o problema da partida a frio, quando só tem etanol no tanque. O famigerado tanquinho de gasolina nem deveria ter existido: ou o carro é flex ou não é. Existe a alternativa de trocar o tanquinho pelo aquecimento do etanol, mas de custo elevado e só utilizada em alguns modelos sofisticados.
Outro problema do flex foi provocado pela política do governo em segurar o preço da gasolina para evitar a inflação. A Petrobras, estatal, assumiu o prejuízo. Mas o preço da gasolina limita também o do álcool, o que levou os usineiros a reduzir sua produção ou migrar para o açúcar.
E mais: o flex estimulou postos desonestos a aumentar o percentual de etanol na gasolina. O motor flex não reclama, pois foi projetado para isso e só se percebe a maracutaia quando a conta do consumo chega no bolso. Mas é problemão para quem tem carro a gasolina (nacionais mais idosos ou importados): seus motores suportam um máximo de 25% do etanol anidro e protestam com engasgos, espirros e oxidação de componentes com a parcela criminosa do álcool hidratado acrescentado na calada da noite.
Turbinar o motor flex é solução para torná-lo mais eficiente, porém de custo elevado. Mas a tendência mundial de reduzir a cilindrada dos motores (“downsizing”) incentivou a aplicação da turbina em maior escala, o que poderá reduzir seu custo e viabilizar sua aplicação nos motores flex.
Se o Brasil fosse um país sério, o caminho natural seria estimular a engenharia brasileira a desenvolver um motor a etanol tão (ou mais) eficiente quanto os melhores a gasolina do mundo e acabar com o engodo do flex. Mas, para isso, o governo brasileiro teria que retornar a palavra planejamento ao seu dicionário.