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O perigo mora ao lado

Governo está mais preocupado em atrair as luzes dos holofotes do que em resolver de fato os problemas que afligem os brasileiros

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Os ministros brasileiros são chegados a umas tantas bravatas e aos holofotes. Muito discurso e pouca ação.

Nelson Jobim sofreu na pele (ou melhor, no joelho) e esbravejou contra a redução de espaço entre poltronas, artifício usado pelas companhias de aviação para aumentar o faturamento às custas do desconforto dos passageiros. Anunciou novidades nos aeroportos, que continuam sendo ansiosamente esperadas pelos brasileiros.

Enquanto o ministro da Defesa bravateia no ar, seu colega Tarso Genro decidiu voltar baterias para o trânsito rodoviário, escandalizado com os números trágicos de acidentes nas estradas. E anunciou medidas enérgicas para reduzir as barbaridades cometidas pelos "delinqüentes do trânsito". E tome holofote da imprensa, ao prometer redução no limite do teor alcoólico, criminalização do excesso de velocidade e - estava demorando uma idéia estapafúrdia - atrelar o valor da multa ao do automóvel. Ou seja, o dia em que o motorista estiver afim de cometer umas estripulias, ele deixa o BMW na garage e pega a BMV (Brasilia muito velha) do jardineiro.

O ministro da Justiça deveria ser informado de que legislação de trânsito já existe, o que falta é ser aplicada. Se a luz dos holofotes não ofuscasse sua visão, estaria preocupado com a implantação da inspeção veicular determinada há 10 anos pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB). E com a reparação das rodovias, com uma fiscalização mais atuante, com a formação mais acurada dos motoristas e uma educação de trânsito mais ampla e objetiva.

Tarso está certo ao atacar os motoristas alcoolizados e os infratores da lei. Mas talvez não tenha sido informado de que automóvel sem condições mínimas de segurança, estrada esburacada, falta de fiscalização e auto-escola ineficiente também matam.

Aliás, por falar em Tarso Genro, talvez ele não saiba que seu ministério tem o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) que deveria agir em consonância com seu pomposo nome, pois não se preocupa com roda recuperada, fluido de freio não-homologado, amortecedor recondicionado e outras aberrações que também matam nas estradas. O departamento jamais exigiu controle ou fiscalização dos componentes de segurança postos à venda livremente no mercado paralelo. Enquadrar pequenos fabricantes, do tipo fundo de quintal, não atrai os holofotes...

Mas não perdoa as montadoras que fazem recalls e procuram resolver o problema detectado no automóvel. Seus burocratas adoram assegurar 15 minutos de fama. Não tiram, porém, o traseiro da cadeira para descobrir que o perigo mora ao lado, exatamente no fabricante que não faz o recall ou que o faz na calada da noite e deixa o motorista correndo riscos.

Se o ministro da Justiça está preocupado de fato com as mortes no trânsito, em vez de anunciar medidas bombásticas, poderia começar botando ordem na própria casa.