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O milagre e o santo

O milagre só acontece depois de milhares de horas de engenheiros que se dedicaram aos projetos de segurança automobilística

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"Carro derrapa na curva, sai da estrada, bate no barranco em alta velocidade e capota. Por um verdadeiro milagre, apesar da destruição quase total do automóvel, motorista e passageiros saem ilesos, com ferimentos leves".

A notícia é frequente, principalmente nessa época de asfalto molhado. Mas o curioso é que o jornalista, além de descrever o fato, quase sempre o tempera com sua visão pessoal: "Por verdadeiro milagre"....

Se o texto fosse elaborado com rigor técnico, seria assim: "O automóvel, apesar do forte impacto frontal seguido de um capotamento lateral, teve a carroceria profundamente danificada. Entretanto, os passageiros pouco sofreram graças à moderna tecnologia de segurança desenvolvida pelo fabricante".

Simulação

Nos automóveis modernos, a carroceria, por exemplo, é projetada de forma a ter uma deformação diferenciada. Sua estrutura frontal é propositalmente mais frágil que a central e, por isso, a parte dianteira, onde está o capô, se deforma no momento do impacto. E absorve a maior parte das forças provenientes do choque. Já o habitáculo de passageiros é bem mais resistente para proteger quem estiver em seu interior.
Esse efeito foi obtido depois de milhares de horas de engenharia dedicadas ao desenvolvimento de carrocerias mais seguras. Automóveis foram arremessados contra paredes de concreto ("crash-tests"), simularam capotamentos e outras situações de perigo para os passageiros.

Além das simulações, engenheiros ficam de plantão junto aos policiais rodoviários e os acompanham quando são chamados para socorrer feridos em acidentes. Os automóveis envolvidos são filmados e analisados para se avaliar, em casos reais, quais são os danos provocados nas carrocerias e nos passageiros.

Guilhotina

No passado, várias fábricas decidiram mudar a articulação do capô, que passaram a se abrir ao contrário, ou seja, se levantando para a frente. Até Ferrari e Rolls-Royce adotaram a idéia. No Brasil, o Opala teve esse sistema durante alguns anos. O motivo alegado era a "segurança": se a trava se soltasse, o vento não jogaria o capô contra o para-brisa, mas, ao contrário, o impediria de abrir, preservando a visibilidade do motorista. Quando se iniciaram os "crash-tests", os engenheiros perceberam que o sistema era perigosíssimo: no caso de choque frontal, o capô era arremessado contra o parabrisa e entrava carro adentro, decepando motorista e passageiros.

No passado, o volante matava o motorista num choque frontal. As vezes, o carro não sofria quase nada, mas a coluna de direção recebia o impacto e o empurrava contra seu peito. Hoje, a coluna recua, mas não empurra o volante, graças a uma simples e barata articulação. Por falar em simples e barato, alguém já fez as contas de quantas centenas de milhares de vidas foram poupadas no mundo graças ao cinto de segurança?

Deu para perceber que, quando vidas se salvam num acidente de automóvel, dá para contar o "milagre" e também o "santo"?