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O computador e o araminho

O motorista reclama que a eletrônica encareceu alguns serviços e componentes. Mas se esquece de que reduziu drasticamente o custo de outros

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Diretor de uma concessionária comentava outro dia suas dificuldades no relacionamento com os clientes.

"As montadoras investem centenas de milhões de dólares para apresentar seus produtos ao mercado. Novo design, tecnologia de ponta, conforto, segurança, respeito ao meio ambiente, todas as novidades são apregoadas e exaltadas na publicidade.

Quem compra hoje um automóvel zero acaba tendo a impressão de estar levando um produto tão evoluído e perfeito que não precisa de manutenção, nem tem peças com duração limitada e de troca obrigatória.

E aí, depois de rodar com o carro um ano, chega a hora da revisão e o dono se assusta até com a conta da troca de óleo e filtros."

Ele não deixa de ter razão. A engenharia das montadoras evoluiu muito e eliminou ou prolongou o prazo de troca de vários componentes mecânicos. As velas do motor, que duravam cerca de 10 mil quilômetros, chegam hoje aos 100 mil. A maioria das caixas de marchas nem exige mais a troca de óleo. Lubrificação (da suspensão, com graxa) é palavra quase eliminada no dicionário especializado. Platinado que colava e carburador que entupia, duas fontes permanentes de dor de cabeça para o motorista, viraram peças de museu e todo o controle do motor é de responsabilidade da central eletrônica.

Em compensação, não adianta mais levar no porta-luvas a lixa de unha para consertar o platinado nem um araminho para desentupir o giclê do carburador. Se o carro estraga na estrada (o que vai ficando cada vez mais raro), a única ferramenta que funciona é o celular - para chamar o reboque.

Da mesma forma, o diretor da concessionária chamava a atenção para a evolução das oficinas nas últimas duas ou três décadas. Dos investimentos necessários para equipar uma oficina com computadores de última geração e da formação de engenheiros e técnicos responsáveis por sua operação. Dos sofisticados aparelhos eletrônicos necessários para verificar e ajustar outros sistemas mecânicos.

Motoristas que reclamam dos preços cobrados pelas oficinas, alegando que os serviços ficaram mais caros, se esquecem de que dificilmente seu carro pára hoje na estrada por um defeito mecânico, evitando o custo do reboque e de outros prejuízos e inconveniências causadas pelo problema.

A evolução tecnológica do automóvel não provocou necessariamente manutenção mais cara: pode ser que você pague mais cada vez que leva o carro à oficina. Mas, com certeza, ele visita a oficina muito menos do que no passado.

Até aí, o raciocínio das concessionárias está correto. Elas só perdem a razão quando decidem extrapolar e faturar desonestamente, ao executar serviços rigorosamente desnecessários durante as revisões.

Um bom exemplo é a limpeza de bicos injetores e descarbonização do motor, operação que nenhuma montadora do mundo prevê em seu plano de manutenção, mas que oficinas (de concessionárias ou não) decidiram empurrar nos clientes, com a única finalidade de engrossar seu faturamento mensal.