Antes do carro flex, o etanol foi para o tanque do automóvel com o plano Pro-álcool do governo federal, lançado em 1977. Foi um sucesso e as vendas do carro com o combustível derivado da cana de açúcar chegaram a 98% do mercado doméstico. Quem tinha motor a gasolina, o convertia para o etanol.
Mas o sonho durou pouco mais de 10 anos e virou pesadelo no fim da década de 1980, quando o combustível verde faltou nos postos e formaram-se extensas filas de motoristas arrependidos. A maioria fez a conversão reversa: do etanol para gasolina. Foi a derrocada do carro a álcool.
A eletrônica solucionou o problema e tornou possível lançar, em 2003, o carro flex, que aceita ambos os combustíveis. Eliminou então o receio do motorista de se tornar novamente refém das inconstâncias de humor dos produtores de etanol.
Mas as estatísticas não deixam margem a dúvidas: é uma falácia afirmar que o flex é solução para a descarbonização, pois, apesar de ele representar 85% da nossa frota, a gasolina ainda representa 70% das vendas nos postos.
Carro “limpo” de fato
Soluções que reduziriam, de fato, as emissões veiculares a partir do álcool:
1 – Incentivar o motor que só queima etanol. Ele já foi desenvolvido por algumas fábricas e a Stellantis já o tem quase pronto na prateleira. Mas todas aguardam o momento correto para oferecê-lo ao mercado: quando governo e usineiros se entenderem e o mercado perder o receio do álcool.
2- Aumentar a competitividade do etanol e induzir o motorista a abastecer com ele o carro flex, reduzindo seus impostos e aumentando os da gasolina, para que a diferença dos preços seja realmente interessante.
Atualmente, o custo menor do álcool apenas compensa seu maior consumo, pois seu preço na bomba é de cerca de 70% da gasolina, sem vantagem real para o bolso do motorista. Por isso, até que seja atraente de fato e reduza o custo do quilômetro rodado, a gasolina ainda tem a preferência do mercado.
A vantagem deste caminho é contemplar todos os carros flex que já circulam. A desvantagem é – por aumentar o imposto da gasolina – pesar no bolso de quem ainda é obrigado a abastecer com ela os modelos com mais de 20 anos de fabricação, que representam quase 4 milhões de carros. Mas poderia se tornar uma vantagem se o governo arquitetasse um plano para incentivar seu sucateamento.
Vantagens do motor a etanol
Eficiência - Ele já está praticamente pronto nas prateleiras de algumas fábricas. Como não exigiria uma calibragem especial para receber também a gasolina, poderia ter maior eficiência e extrair todo o potencial do etanol, aumentando o desempenho e reduzindo consumo.
Limpo – O etanol tem apenas 1/3 do teor de carbono em relação à gasolina e, por isso, mantém os motores mais limpos, livres de carbonização. Diminui também o impacto ambiental, até porque a cana de açúcar, ao crescer no campo, ainda elimina parte do CO² expelido pelo escapamento.
Mais barato – Menor custo de produção, pois não exige o software nem os sensores necessários para ajustar seu funcionamento ao combustível no tanque.
Descarbonização – O motor a combustão já não está com os dias contados? A solução não será o carro elétrico? Depende.
Em termos de eficiência, o motor convencional já deveria estar há muitos anos no museu, pois é um “perdulário” e só aproveita de 30% a 40% da energia contida em cada litro de combustível no tanque. O resto é jogado no lixo em forma de calor. O elétrico tem eficiência superior a 90%.
Entretanto, em termos de controle ambiental, acredite se quiser, um carro híbrido abastecido com etanol emite menos CO² (86g/km) que o elétrico recarregado com energia “suja” (95g/km). Na Europa, por exemplo, onde ela vem, em geral, de usinas a carvão, diesel ou gás. Ou seja, a poluição é transferida do carro para o campo.
O resumo da ópera é que, carro híbrido com motor flex abastecido com etanol é a melhor solução para a limpeza ambiental. Já existe um com esta configuração no Brasil, o Toyota Corolla, e outros estão a caminho. Por outro lado, carro flex abastecido com gasolina ou elétrico recarregado com energia “suja” não passam de uma solução hipócrita para a descarbonização do mundo.
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