“Quando a esmola é grande, o santo desconfia”. Eis um dos provérbios mais populares e que se aplica a um dos artigos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Reconhecido como minucioso em excesso, além de abrigar nada menos de 341 artigos, fora os anexos, o CTB deixou vários pontos por regulamentar desde que entrou em vigor, em 22 de janeiro de 1998.
E não para por aí. Coube ao Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aprovar resoluções regulatórias, com força de lei, sem contar as portarias do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Em dezembro de 2008, a coluna recebeu uma publicação que consolida toda a legislação complementar. Trata-se de um calhamaço de 708 folhas de tamanho ofício e letra miúda. Se atualizado até 2012, talvez alcançasse as mil páginas.
Punitivo por essência e quase nada educativo, no CTB há um conceito racional no artigo 267: “Poderá ser imposta a penalidade de advertência por escrito à infração de natureza leve ou média, passível de ser punida com multa, não sendo reincidente o infrator, na mesma infração, nos últimos 12 meses, quando a autoridade, considerando o prontuário do infrator, entender esta providência como mais educativa. Parágrafo 1º – A aplicação da advertência por escrito não elide (não elimina) o acréscimo do valor da multa prevista no parágrafo 3º do artigo. 258, imposta por infração posteriormente cometida. Parágrafo 2º – O disposto neste artigo aplica-se igualmente aos pedestres, podendo a multa ser transformada na participação do infrator em cursos de segurança viária, a critério da autoridade de trânsito”.
Independentemente de jamais um pedestre (ou ciclista) receber multa, esse artigo foi, afinal, regulamentado e vige desde 2012, “apenas” 14 anos depois. Algo simples e justo, mas como tem potencial de redução na arrecadação de multas, ficou esquecido. O motorista pode redigir um recurso e pedir a conversão da multa, o que já desanima: poucos estão informados e/ou conhecem os trâmites.
Porém, a partir deste mês, o Detran do Distrito Federal, em rasgo de clarividência raro no setor, colocou seus programas de computador para funcionar. Caso se enquadre no artigo 267, o infrator nem chega a receber notificação: ganha apenas advertência por escrito, conforme prescreve o código. Está aí um exemplo para aplausos. Todos os outros Detrans deveriam segui-lo, mas certamente não o farão, apesar das facilidades atuais da eletrônica de controle. Na realidade, a regulamentação nada impôs sobre o modo operacional e os governos não querem perder receita.
Mas há algo perverso, a tal esmola duvidosa. Por qualquer meio, o motorista não pode recorrer da pretensa infração convertida em advertência, mesmo sem concordar ou ter como provar que é inocente. Deve aceitar o perdão, sem discutir. É ou não é para o santo desconfiar?
RODA VIVA
APESAR de a GM nada revelar, a nova geração do Cruze (2015) será produzida na fábrica argentina de Rosario, como a coluna já antecipou. Cessará a montagem CKD do modelo em São Caetano do Sul (SP). Tendência geral é essa: compactos aqui e médio-compactos no vizinho. Por razões de menor escala de produção e controle “frouxo” de conteúdo local na Argentina.
PREÇO até R$ 2,9 milhões, motor V12 dianteiro (6.2/740cv) no lugar do V8, aceleração até 100km/h em 3,1 s. Ferrari F12berlinetta foi pré-apresentado no autódromo de Interlagos, pouco mais de um ano após ser lançado no Salão de Genebra. O importador, Via Itália, afirma que esse superesporte pode lidar melhor com o dia a dia do que gerações anteriores. Inspiração Porsche?
PRISMA vai bem com motor de 1.0 litro/80cv (mais potente nessa cilindrada, juntamente com o do Clio e o três-cilindros do HB20), menos na estrada, com carga total. Marchas precisam ser esticadas para ter agilidade. Versão de entrada (R$ 34.990) permite opção da ótima central multimídia. Na ergonomia, puxador nas portasruim e tampa do porta-luvas ótima (abre para cima).
FLUIDEZ de linhas e espaço interno garantido por 2,7m de distância entre-eixos, Cerato é aposta da Kia entre os médio-compactos. Agora com motor flex 1.6/128cv (igual ao HB20), o sedã vem completo, só versão topo. Mas seu preço disparou por não se enquadrar nas regras do Inovar-Auto. Por R$ 67.400 (automático, mais R$ 4.500), difícil concorrer.
OUTRO que perdeu competitividade em preço foi o hatch Hyundai i30, cujo motor 2.0 foi substituído pelo 1.6. Atrapalha, ainda, a valorização recente do won sul-coreano. Nada dramático, como ocorre com o iene japonês, porém relação preço-equipamento imbatível, aos poucos, pode sofrer erosão discreta.
SEM aumento do IPI, antes previsto para 1º de abril e agora mantido até 31 de dezembro, a estratégia de preços de cada marca teve que sofrer adaptações. Algumas aproveitaram para realinhar suas tabelas, além da simples adequação ao imposto que deixou de subir. Se não está vendendo tão bem, nada como aproveitar a deixa e usar a oportunidade para repensar a vida.