DE MARSEILLE (França)* - Até o início da década de 1980, a Mercedes-Benz tinha apenas duas linhas de sedãs, a 200 (que depois virou Classe E) e a 300 (chamada depois de Classe S). Para ampliar a gama, surgiu em 1982 o 190, um sedã compacto logo apelidado de Baby Benz, que, 10 anos depois, foi rebatizado de Classe C.
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Trinta anos depois, surge um novíssimo e também compacto sedã da marca, o CLA derivado do novo Classe A hatch lançado no ano passado. O novo Baby Benz é o primeiro sedã Mercedes com tração dianteira.
Para começo de conversa, se você acha que o novo Classe A hatch tem alguma coisa a ver com o antigo produzido em Juiz de Fora entre 1999 e 2005, passe uma borracha, pois o projeto começou com um papel em branco. Ficou só o nome, pois ele não tem mais nada a ver com o antigo modelo. Aliás, restou o Classe B, um monovolume um pouco maior e de mesma concepção.
BRIGA Ao contrário do antigo Classe A, um modelo típico para a família, o novo hatch foi projetado pensando no público jovem, para brigar com o BMW Série 1. E o CLA é ainda mais atraente, pois é quase uma miniatura do superestiloso CLS, o Mercedes que introduziu em 2003 o conceito do sedã-cupê, ou cupê de quatro portas, copiado até hoje por diversas marcas. Cada detalhe de sua carroceria foi projetado para conferir modernidade e tornar o CLA inconfundível.
Eu dirigi o Classe A hatch no ano passado, durante a apresentação para a imprensa especializada mundial na Eslovênia. O roteiro do test-drive foi caprichosamente sinuoso, pois o forte da suspensão é o acerto ao conjugar conforto e estabilidade. A fábrica repetiu a dose no sedã, no início desse mês, utilizando estradinhas bem apertadas no Sul da França, entre Cassis e Marseille. Mal se percebe o peso adicional do terceiro volume, pois mesmo com o porta-malas destacado o carro continua grudado no chão. A tração dianteira levou muitos a apostarem numa tendência a escorregar de frente. Mas qual o quê! Os engenheiros de Stuttgart souberam dosar com perfeição a suspensão do carro que roda com a suavidade que se espera de um Mercedes e a estabilidade de um BMW. Só com as rodas viradas e o acelerador no fundo é que se percebe estar num carro de tração dianteira, e por poucos segundos, pois o carro tem (opcionalmente) a tração nas quatro “on demand”, ou seja, quando os sensores percebem a necessidade, desviam parte da potência para o eixo traseiro.
O CAÇULA DO CLS
O estilo inconfundível do cupê de quatro portas inaugurado em 2003 e copiado por vários fabricantes e agora pela própria Mercedes no modelo sedã do Classe A hatch
São várias motorizações a diesel e a gasolina. Os jornalistas brasileiros rodaram no mais potente a gasolina, o 250, um quatro cilindros (1.991cm³) com 211cv. Quer dizer, mais potente só até chegar a versão AMG (A 45, já exibida em Genebra) desenvolvendo incríveis 365cv a partir do mesmo bloco de dois litros.
O interior é idêntico ao do hatch, muito sofisticado e todo conectado com a parafernália eletrônica de comunicação. Painel muito caprichado, na medida certa e muito bem-acabado. A alavanca de mudanças segue a mesma solução de outros Mercedes maiores e mais sofisticados: fica na coluna de direção, abrindo lugar para outros comandos e porta-trecos entre os bancos. Há um bom espaço para motorista e passageiro, mas no banco traseiro vão apenas duas pessoas com certo conforto e roçando o joelho nos encostos dianteiros se eles estiverem regulados no limite. A Mercedes define o espaço como 2%2b1, ou seja, coitado de quem vai no meio. Para ser mais correta, ela deveria defini-lo como “80% de 2%2b1”, pois a curvatura descendente do teto (para criar a imagem de cupê) faz os mais altinhos esbarrarem a cabeça. O belo design cobra seu preço também na visibilidade traseira, prejudicada pelo vidro reduzido e o pilar (coluna) C.
PRAZER
Dirigir o CLA é extremamente prazeroso, principalmente o 250, bom de aceleração: até 100km/h em apenas 6,7 segundos e máxima de 240km/h. O câmbio tem dupla embreagem (DSG), sete marchas e aletas para passagens manuais no volante. Há momentos em que ele poderia trocar um pouco mais rápido, no modo automático. Usando as aletas, o problema fica resolvido. A direção também contribui para se esquecer de que se trata de uma tração dianteira, pois é leve (assistida eletricamente) e precisa em qualquer situação. Nada de volante muxibento em elevadas velocidades...
O porta-malas não é excepcional, mas coerente: os 340 litros do hatch foram aumentados para 470 litros no sedã. O entre-eixos não mudou (2,70m), mas o comprimento cresceu (34cm) para 4,63 metros.
A turma da aerodinâmica brilhou no CLA: enquanto a concorrência briga para chegar a um coeficiente (Cx) um pouco abaixo de 0,30, o novo sedã bateu o recorde com apenas 0,22. Mas apenas por alguns dias, só até a Volkswagen ter anunciado que o XL1 (Cx de 0,19) deixa de ser carro-conceito e entra na linha de fabricação...
Em resumo, o novo Baby Benz é um autêntico Mercedes, seja no estilo, acabamento ou comportamento dinâmico. Paga-se um preço pelas linhas arrojadas de um cupê compacto de quatro portas, mas o balanço é extremamente favorável e o CLA já deve estar prejudicando o sono dos diretores da BMW...
E NO BRASIL?
O novo A hatch será importado a partir do segundo semestre e o CLA está previsto para o início de 2014, custando cerca de R$ 100 mil. Mas a Mercedes confirma os estudos adiantados para produzi-los no Brasil. Vem logo a pergunta: se o antigo Classe A foi um fracasso no nosso mercado, por que cargas-d’água voltar a fabricá-lo aqui?
A resposta não é complicada. Primeiro, porque o modelo fabricado em Juiz de Fora (um monovolume) estava longe da imagem que o brasileiro fazia de um carro da marca. Segundo, porque, apesar de toda sua sofisticação eletrônica, era considerado caro por ser um compacto com preço de médio. Finalmente, não pertencia a uma família: era modelo único sobre sua plataforma.
Atualmente, a Mercedes pensa em fabricá-lo numa joint venture com a Nissan, que constrói uma fábrica no estado do Rio de Janeiro. De onde sairia também um “meio-irmão”, o Infiniti Etherea. Ou ampliar a de Juiz de Fora, que hoje só produz caminhões. E, mais importante, a nova plataforma Classe A foi pensada para abrigar cinco modelos: hatch, sedã, perua, SUV e monovolume, o que aumenta o volume, reduz custos e viabiliza o projeto. Não é a toa que o novo presidente da Mercedes-Benz do Brasil a partir de junho será Phillip Schiemer, que já foi seu diretor durante muitos anos e ocupa – até o fim de maio – na Alemanha o cargo de vice-presidente da divisão mundial de automóveis.
Desta vez, um Classe A produzido no Brasil tem tudo para dar certo, não?
(*) Jornalista viajou a convite da Mercedes-Benz do Brasil